Ao ilustrador iniciante I


DESENHO X ILUSTRAÇÃO

Para começar a entender esta profissão, é importante compreender, logo de cara, a diferença entre desenho e ilustração. Então, sem rodeios, vamos dizer logo: desenho não é ilustração.

Hã?! Hein?! O que?! Não é?

Não, não é!

O desenho, na verdade, é a matéria-prima da ilustração.

O desenho tem independência, tem existência própria — pode existir sem um tema, sem um princípio, sem um contexto ou histórico. A ilustração não. Uma ilustração é um desenho firmemente conectado a uma idéia, a um texto, a um conceito. Afinal, a ilustração ilustra alguma coisa, ficando muitas vezes sem sentido longe de seu contexto.

Outra diferença: o desenho é algo muito pessoal.
Podemos desenhar qualquer coisa, a qualquer hora, sem nenhuma orientação externa. Já quando fazemos da ilustração nossa profissão, normalmente temos que ilustrar idéias de outras cabeças (por exemplo: de um jornalista, de um designer, de um publicitário, de um autor de uma crônica etc.). Por isso, um bom ilustrador deve saber compreender a necessidade de outros e, para isso, deve agregar outras habilidades à sua habilidade de desenhar, entre elas a interpretação de textos e uma boa cultura geral — para estar sempre por dentro do assunto a ser ilustrado. Em resumo: O desenhista é criador da mensagem, o ilustrador é mensageiro, ele leva mensagens que não são dele.

Quanto a foco, ilustração e desenho também são diferentes.
Um desenho eu posso fazer para mim mesmo. Assim como um artista plástico, eu não preciso necessariamente agradar a um público, nem me esforçar para fazer alguém compreender o que desenhei — o desenhista/artista teoricamente precisa satisfazer apenas a si mesmo. Já um ilustrador profissional trabalha constantemente tendo um público-alvo em mente: o leitor do jornal ou os pequenos leitores de um livro infantil ou o público que vai ler aquele anúncio que ele irá ilustrar para uma agência. De forma geral, a compreensão da mensagem que a ilustração passa ao público deve ser sua primeira preocupação.

Como o foco é a mensagem ao público — e não suas intenções pessoais — o ilustrador nem sempre desenha o que quer, mas sim o que precisa para tocar, destacar emocionar, ensinar, orientar ou cativar determinado público-alvo — e muitos profissionais, que não entendem a diferença entre ilustrador e artista/desenhista, acabam se sentindo frustrados com isso. Ficam sempre com a sensação de que sua criatividade está sendo tolhida — e trabalham sempre com um gosto amargo na boca.

Por todas estas razões é que sempre defendo que um bom desenhista não é necessariamente um bom ilustrador — enquanto, muitas vezes, desenhistas aparentemente toscos acabam, pela criatividade e expressividade com que abordam cada tema, por se transformarem em grandes ilustradores.

(versão original do texto publicada no antigo site do Estúdio Ilustranet em nov/2006)

5 comentários:

  1. Não poderia concordar mais. Excelente explicação.
    Aplausos.

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  2. essa eu não sabia!
    fiquei até com dúvida se devo mudar ou não o nome do meu blog, eder-ilustracoes.blogspot.com

    vlw pela matéria

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  3. Vixi, excelente texto, parece um tapa na cara.
    Queria deixar meu blog para a galera visitar e me dizer o que acha: www.liofreitas.blogspot.com
    Valeu desenhistas ilustradores (rs)

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  4. Muito legal o texto!! Ele chega quase a abordar alguns dos problemas do ilustrador que é interpretar briefings.... o texto fala que o ilustrador tem algo a comunicar, um foco, mas ouço muito de clientes, chefe e amigos que trabalham com design ou publicidade, que lançama a seguinte frase: faça uma ilustração que desperte o interesse a leitura.
    Alguém aí acha que isso realmente é possível?
    Como medir isso? Seria pelo simples gosto etético de cada um?

    fica aí várias perguntas....

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  5. Muito inteligente sua colocação Johnfeijaum. Não podemos esquecer que no mercado além dos problemas com o ilustrador que não entende briefings TAMBÉM temos o grave problema de editoras e clientes em geral que não SABEM (ou não querem) fazer briefings...traduzindo, este que citou é o famoso briefing chamado "ilustrador, se vire aí!"

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